Estudo feito na Universidade Federal do Paraná analisou 12 fazendas do Sul e Sudeste do Brasil e apontou falhas de manejo.

Decapitação, asfixia e hipotermia. São algumas das práticas adotadas no abate de tilápias encontradas pela pesquisadora Ana Silvia Pedrazzani, do Laboratório de Bem-Estar Animal da Universidade Federal do Paraná (Labea-UFPR). Pós-doutoranda em bem-estar animal, a veterinária percorreu 12 locais no Sul e Sudeste do país para avaliar o manejo na criação e abate. A pesquisa resultou em um protocolo inédito para manejo humanitário da espécie mais cultivada pela piscicultura brasileira.

“A gente tem que entender que o meio de vida do animal é o aquático e toda vez que a gente remover ele da água vai ser um estresse. É só pensar no contrário. Quando a gente inverte a situação, a gente consegue perceber o quão aversivo ela é”, destaca a pesquisadora.

O protocolo traz parâmetros mínimos de qualidade de água e outros já adotados pela indústria. Também aponta falhas nos métodos de abate humanitário usados no Brasil. O principal deles, a termonarcose, consiste em deixar o animal em água com gelo após a sua captura para que, por hipotermia, ocorra sua insensibilização antes do abate.

“São mitos que muitas vezes são levados a outras gerações que continuam fazendo esses procedimentos sem ter ideia do que está acontecendo. Não é uma má intenção nem um descaso. Simplesmente é a informação incorreta de que aquilo é o correto”, diz a pesquisadora.

Segundo ela, as tilápias demoram, em média, 15 minutos para perderem a consciência, o que fere os preceitos de abate humanitário. “O humanitário tem que ocorrer imediatamente após a insensibilização e 15 minutos está muito longe de ser algo instantâneo”, acrescenta a veterinária.

Nas visitas de campo, o ponto mais crítico observado durante a pesquisa se deu justamente no manejo prévio e durante o abate, quando passam longos períodos fora da água. “O ideal seria que isso fosse feito já sugando os animais do tanque passando por um tubo com água e choque elétrico para que saíssem já abatidos na outra ponta”, relata Pedrazzani, pontuando que esse tipo de tecnologia ainda não está disponível no mercado.

Viabilidade econômica

O presidente da Associação Brasileira de Piscicultura (PeixeBR), Francisco Medeiros, reconhece que as sugestões são positivas, mas dúvida da sua viabilidade econômica. “O documento é bom, tem várias sugestões interessantes, mas esta, especificamente (alternativas de manejo pré-abate), ainda não é sustentável neste momento. Contudo, a linha é essa mesmo, o caminho é esse”, ressalta o produtor.

Ele lembra que a indústria já adota protocolos mínimos de bem-estar animal estabelecidos pelo Ministério da Agricultura (Mapa), entre eles a termonarcose. “O único processo que o Ministério da Agricultura autoriza hoje pra abate é esse. Eu até posso ter uma ação importante que traga mais bem-estar e traga melhor qualidade, mas, se eu não tiver regulamentado, eu não posso implementar”, afirma Medeiros.

Segundo ele, o estudo é importante pois ajudará na discussão e no aprimoramento das normas vigentes hoje no país. “Sabemos que essa é uma estrada que não tem retorno e todo dia nossas ações têm que ser no sentido de proporcionar bem estar animal. Até porque a qualidade do produto é outra”, destaca o presidente da PeixeBR.

Para a pesquisadora da UFPR, o ganho financeiro é consequência do bem-estar animal, mas não deve ser o foco na elaboração dos protocolos oficiais. “Até dez anos atrás, isso sequer era discutido. Mas a partir do momento em que os peixes estão sendo mais reconhecidos como animais que sofrem, que sentem dor, isso tem que evoluir”, argumenta Ana Silvia.

FONTE: Globo Rural